“É agora o momento favorável, é agora o dia da salvação”
Hoje iniciamos um tempo especial. Um tempo favorável. Não são dias de tristeza, nem de amargura... Hoje não celebramos cinzas
porque temos medo de Deus, por causa de nossos pecados e da dureza com a
qual poderíamos ser julgados. Celebramos nossa pequenez diante de um
Pai de amor, que nos dá um tempo para crescermos como gente, na imitação
de seu Filho. Eis que celebramos nossa Páscoa.
O que é a quaresma? Qual seu sentido? O que tem a ver com nossa vida?
Na
Igreja Antiga, os sacramentos da iniciação cristã eram celebrados
apenas na noite da vigília pascal. Quando Cristo ressurge dos mortos e
vence o pecado e a morte, também os cristãos são chamados a ressurgirem
com ele para uma nova vida. O Batismo é a Páscoa dos Cristãos.
Para a celebração do batismo,
naquela noite santa, os catecúmenos passavam por um longo período de
preparação, chamado catecumenato. Nos últimos dias deste período
intensificava-se a prática das virtudes, da penitência e da vigilância
cristã, ao mesmo tempo em que os responsáveis verificavam a idoneidade
do candidato ao batismo. Este período era chamado de “Tempo da
Purificação e Iluminação” e durava cerca de quarenta dias.
Com o passar dos séculos,
criou-se o costume de se renovar os compromissos batismais também
durante a noite pascal, enquanto os novos cristãos nasciam da fonte do
Batismo. Daí decorre que os quarenta dias antecedentes serviam também de
preparação para essa renovação: surge assim a Quaresma como a
conhecemos hoje.
Neste tempo, a Mãe Igreja nos
dispõe exercícios e práticas que nos ajudam a conduzir para a renovação
do nosso compromisso de fé com Deus. Se fomos batizados como crianças,
agora, já adultos, por nós mesmos, percorremos o caminho catecumenal de
purificação e iluminação para que, na páscoa, ressurjamos das trevas
para a luz com o Cristo Ressuscitado dentre os mortos.
“Aquele que não cometeu nenhum pecado, Deus o fez pecado por nós”
O que significa ressurgir com
Cristo? Ressuscitar com Ele implica em morrer com ele. Este tempo de
preparação é já nossa celebração pascal. Nosso Senhor Jesus Cristo
derrotou o pecado pisando na cabeça da serpente que nos dominava. E que
serpente era essa? Aquela mesma que apresentou o fruto proibido a nossos
primeiros pais: o fruto que prometia sermos deuses...
Querer ser deus é a grade
tentação humana – é pecado original porque está na origem temporal da
maldade humana, mas também porque é a origem existencial de todo pecado
que cometemos. Antes de pecarmos precisamos primeiramente dizer para nós
mesmos, no fundo de nosso coração: “Eu sou deus, eu sei que isto será
bom para mim – não me importo com mais ninguém a não ser comigo agora,
nesta situação que me realizará mais e mais”.
O pecado de origem nos destrói,
destrói as famílias, destrói as sociedades, destrói a natureza, destrói
tudo. Somos seres feitos para a comunhão e não para o orgulho. Existimos
para sermos felizes juntos, entre nós, com a natureza e com Deus.
Jamais sozinhos... Sozinhos produzimos o horror. Juntos, por mais
difícil que seja, criamos o céu.
Jesus Cristo – aquele que é Deus
verdadeiro, mas também humano verdadeiro – o único que realmente
poderia exigir para si todo louvor e toda grandeza divina, não o quis e
não o fez. De fato, “aquele que não cometeu nenhum pecado, Deus o fez
pecado por nós, para que nele nós nos tornemos justiça de Deus” (2Cor
5,21). Ele esmagou a cabeça da antiga serpente pela humildade. Deus agiu
como humano, sendo o que os seres humanos devem de fato ser: pequenos
servidores de seus irmãos e irmãs. Seres amorosos, seres que cuidam não
apenas de si e de seus egoísticos negócios, mas cuidadores do outro –
seus semelhantes – cuidadores do Jardim que o Senhor nos deu para que
produzisse vida.
“Lembra-te de que és pó e ao pó hás de tornar”
Somos pó, e ao pó retornaremos.
Mas que grande felicidade em ser pó! Não é triste ser pó! Ser pó nos
possibilita fecundarmos o mundo de vida e amor. Ser nada significa
olharmos outro como nosso horizonte de comunhão, felicidade e vida! Ser
pó nos faz sermos nós mesmos, sermos gente, sermos humanos, sermos
Cristo, que se fez nada para nos salvar, e, com Ele, e nEle, do jeito
dEle, sermos divinamente nós mesmos.
Meu irmão jovem! Hoje a Igreja
convida você a olhar para si mesmo com a riqueza que você tem! Nem mais e
nem menos do que você é! Simplesmente jovem, simplesmente humano! Hoje
você, eu, e todos nós, somos convidados a adentrar neste caminho da
páscoa – morrermos para nosso orgulho para ressuscitarmos para uma vida
que realmente vale a pena! Quarenta dias de jejum, para nos lembrarmos o
quanto somos nada – dependentes das coisas para viver. Quarenta dias de
caridade, para nos recordar que somente no amor e na fraternidade
poderemos nos realizar como gente. Quarenta dias de oração para
recordarmos que somente Deus é o Senhor, e nós somos uma poeirinha amada
por Ele.
Não tema adentrar neste caminho
quaresmal! Esmague você também a cabeça da serpente que um dia te
escravizou! Avante! Você é Sentinela de uma manhã na qual Deus será tudo
em todos numa nova civilização de amor e comunhão! “É agora o momento
favorável, é agora o dia da salvação.” (2 Cor 6, 2). Vamos nessa?
PE. ALEXSANDER CORDEIRO LOPES